21.12.08

Gotas de Introspecção

Ganhei um prêmio no blog de uma mulher fantástica chamada Gizelli Sousa que tem um blog delicioso chamado Gotas de Introspecção, como o autor de melhor história de bêbado. A história, verídica, está publicada lá no seu agradável sítio e aquele doce de pessoa ainda cometeu a gentileza de me enviar um exemplar do livro Botequim de Bêbado tem Dono, do Moacyr Luz e O Guia dos Mochileiro das Galáxias, de Douglas Adams. Sweet!

Marcelo Gleiser — Um Breve Manifesto

Estava outro dia esperando uma amiga minha no ponto de ônibus e, como já é de costume, dirigi-me a uma banca para comprar uma revista para matar o tempo. Há muito não consumo mais títulos como Superinteressante ou Galileu por estarem cada dia mais rarefeitas e voltadas para assuntos excessivamente pop. Menos ciência e mais curiosidades. Mas na revista científica da Editora Globo desse mês um texto do Marcelo Gleiser me chamou atenção. Nele ele discorre sobre como as pessoas errôneamente acham que a ciência é um anti-glamurizador do mundo, que solapa com suas perguntas e questionamentos a beleza que há nos mistérios da realidade.

Acho engraçado como a maioria de nós se escora em coisas que carecem de qualquer respaldo minimamente lúcido em prol de uma tradição sem razão de ser, ou apenas repetir aquilo que foi repetido para e pelas gerações que nos antecederam.

Nesse final de 2008, cabe aqui uma curta retrospectiva, ano em que me dediquei muito mais à causa laicista e ateísta, percebi que a sociedade está cansada dos velhos dogmas, das velhas formas cegas de ver o mundo. Mas ao invés de se libertarem desse amálgama de mal-gosto com estupidez, chafurdam-se ainda mais em temáticas trancedentais como OVNIs, espíritos e outras formas de misticismo. Não tenho, portanto, bons prognósticos para os próximas anos. Torçamos para que tudo melhore, mas os meus presságios se mostram cada vez menos otimistas.

- - -

Ciência e espiritualidade: um breve manifesto

Na opinião popular, o título deste texto representa um paradoxo. Ciência e espiritualidade habitam mundos diferentes, que em geral entram em conflito ao se aproximarem. A primeira é vista como uma atividade exclusivamente racional, reducionista, materialista e fria, sem qualquer interesse por questões espirituais. Já a segunda, bem mais difícil de ser definida, representa uma busca pessoal, uma relação com uma realidade que transcende o imediato, que nos conecta com o que vai além do material. Por isso a espiritualidade é considerada a antítese da ciência.

Para piorar, a busca espiritual costuma adotar uma posição que não só é contrária ao materialismo científico, mas que o confronta. Ela passa a ser quase que uma "vingança" para quem está desiludido com um mundo cada vez mais explicável, destituído de mágica e poesia. O movimento romântico do início do século 19 foi uma resposta direta ao racionalismo extremo do século 18. O poeta John Keats acusou Isaac Newton de ter "desfiado o arco-íris", de ter roubado a sua beleza com suas explicações precisas sobre o comportamento da luz. Nada poderia ser menos verdadeiro.

Quem fecha os olhos para as descobertas da ciência moderna e se fia na ocorrência de fenômenos sobrenaturais, paranormais, astrológicos, quem acredita que duendes povoam florestas, quem jura que almas circulam pelo mundo dos vivos sem serem percebidas, faz o mesmo que o poeta: nega-se a apreciar a poesia e a beleza que a ciência nos revela, preferindo pensar como nossos antepassados. E sua credulidade é explorada por oportunistas.

Existe mágica de sobra no mundo que podemos ver com nossos olhos e com os instrumentos que inventamos para ampliar a nossa visão da realidade. Não é preciso se fiar numa realidade invisível e sobrenatural, cuja existência depende de relatos individuais e que é sujeita à fé. Quando queremos muito acreditar em algo, isso se torna mais real. O querer acreditar compromete nossa habilidade de decidir imparcialmente - ou quase - se uma asserção é ou não verdadeira.

Se meu pai está doente e a medicina moderna não pode fazer nada por ele, por que não levá-lo a um curandeiro, alguém com supostos poderes de exercer curas milagrosas e inexplicáveis? A morte assusta, foge ao nosso controle, rouba aqueles que amamos. É difícil aceitar a postura materialista de que ela é mesmo o fim, que essa faísca que anima a matéria e nos faz amar e chorar se esvai por completo num piscar de olhos. Nosso dilema é termos consciência de que temos os dias contados. Aceitar esse fato é tão difícil que fazemos de tudo para driblá-lo, criando mecanismos que vão além do que podemos provar. Talvez isso ajude muitos a aceitarem seus destinos. O triste é que os que estão convictos da existência dessa dimensão sobrenatural fechem os olhos para o que a ciência mostra.

Prefiro viver de olhos bem abertos e aceitar a pré-condição da vida, a não-vida. Ignorar o que a natureza nos mostra todos os dias é viver menos, é se apegar a contos de fadas para evitar o confronto com a nossa condição humana. Saber morrer é saber viver, é saber aceitar o quanto são preciosos esses breves momentos que temos para amar, chorar, apreciar a beleza do arco-íris, vibrar com um gol e ter medo de perder quem amamos. É na brevidade da vida que reside o seu segredo: saber viver sem medo de morrer. Isso não é nada fácil, e não acredito que tenha conquistado o meu próprio medo. Mas prefiro viver com ele a me iludir com algo que nunca saberei se está certo ou não.

Ninguém gosta da idéia de morrer ou de sofrer. Ninguém gosta de ver o sofrimento de tantos no mundo. Porém, se a alternativa é achar que tudo isso vai ser diferente no "além", que forças ocultas regem nossas vidas e podem ser controladas por meio de crenças místicas, ela me parece criar uma sociedade que não enfrenta os desafios que tem pela frente, escondendo-se nas promessas de um mundo inescrutável e inexistente.

Para mim, a mágica ocorre a cada momento em que estamos vivos, que podemos amar e sofrer, que podemos refletir sobre quem somos e sobre como podemos melhorar as nossas vidas e as dos que estão à nossa volta. Perceber essa mágica é abraçar a espiritualidade da ciência. Com ela aprendemos quem somos e como nos relacionamos com o mundo e com o Universo. Entre os caminhos que temos para enfrentar nossos desafios, não vejo outro que possa mostrar o quanto a vida é preciosa e rara, que celebre de forma mais clara a mágica da existência.


MARCELO GLEISER é astrofísico, professor do Dartmouth College, nos Estados Unidos, e autor de cinco livros sobre ciência e conhecimento.

30.11.08

O Nevoeiro

Embora um tanto tardio, acabei de assistir O Nevoeiro (The Mist - 2007), baseado na obra homônima do escritor Stephen King e dirigido/roteirizado pelo competentíssimo Frank Darabont. Um tremendo filme sobre o que de melhor e pior aflora em nós nos momentos de desespero e medo, nossas escolhas e decisões em situações limítrofes. Mr.King acertou em cheio mesmo ao deixar quase irrelevante o fiapo de argumento que mal sustenta a presença das criaturas no nosso mundo. O que carrega a história do início ao fim é a idéia de que os piores monstros habitam dentro de nós, e é notável como a estupidez e a ignorância tem poder de despertá-los e nos põem em choque com o que chamamos de racionalidade e vida em sociedade. Brilhante!


"Prometa que não vai deixar os monstros me pegarem" é emblemática e resume em uma linha toda a história.

17.11.08

Gayneralização [2]

Recentemente o Caneca Orbital tem mostrado um pouco de vocação para falar de política, seja comentando as eleições municipais cariocas ou mesmo as presidenciais americanas. Em outra ocasião trouxe à baila a questão do preconceito contra homosexuais, uma questão que me incomoda não só pelo fato de ter um número considerável de amigos gays e lésbicas, mas também por uma questão de tolhimento e desrespeito pela liberdade humana.

Através do jornalista João Marinho do blog Gospel Gay, que fez um bom trabalho de divulgação do próprio trabalho na comunidade Ex-Evangélicos, pude saber sobre a coragem admirável do seu colega de profissão norte-americano Keith Olbermann, âncora da MSNBC. Keith fez um comentário especial durante a exibição do noticiário, onde faz uma defesa brilhante e acima de tudo humana contra a Proposição 8. Essa emenda na constituição americana aprovada no último dia 4 em plebiscito direto, entre outras propostas, criminaliza o casamento entre homosexuais na Califórnia. Segue abaixo a tradução junto com o link do discurso original e legendado de Olbermann no YouTube.

"Alguns esclarecimentos, como prefácio: não é uma questão de gritaria ou política ou mesmo sobre a Proposta 8. Eu não tenho nenhum interesse pessoal envolvido, não sou gay e tive que me esforçar para me lembrar de um membro de minha imensa família que é homossexual. (...) E, apesar disso, essa votação para mim é horrível. Horrível. (...) Porque esta é uma questão que gira em torno do coração humano – e se isto soa cafona, que seja.

Se você votou a favor da Proposta 8 ou apóia aqueles que votaram ou o sentimento que eles expressaram, tenho algumas perguntas a fazer, porque, honestamente, não entendo. Por que isso importa para você? O que tem a ver com você? Numa época de volubilidade e de relações que duram apenas uma noite, estas pessoas queriam a mesma oportunidade de estabilidade e felicidade que é uma opção sua. Elas não querem tirar a sua oportunidade. Não querem tirar nada de você. Elas querem o que você quer: uma chance de serem um pouco menos sozinhas neste mundo.

Só que agora você está dizendo para elas: “Não!”. “Vocês não podem viver isto desta forma. Talvez possam ter algo similar – se se comportarem. Se não causarem muitos problemas.” Você se dispõe até mesmo a dar a elas os mesmos direitos legais – mesmo que, ao mesmo tempo, esteja tirando delas o direito legal que já tinham (o do casamento civil). Um mundo em volta deste conceito, ainda ancorado no amor e no matrimônio, e você está dizendo para elas: “Não, vocês não podem se casar!”. E se alguém aprovasse uma Lei dizendo que você não pode se casar?

Eu continuo a ouvir a expressão “redefinindo o casamento”. Se este país não tivesse redefinido o casamento, negros não poderiam se casar com brancos. Dezesseis Estados tinham leis que proibiam o casamento inter-racial em 1967. 1967! Os pais do novo Presidente dos Estados Unidos não poderiam ter se casado em quase um terço dos Estados do país que seu filho viria a governar. Ainda pior: se este país não houvesse “redefinido” o casamento, alguns negros não poderiam ter se casado com outros negros. (...) Casamentos não eram legalmente reconhecidos se os noivos fossem escravos. Como escravos eram uma propriedade, não podiam ser marido e mulher ou mãe e filho. Seus votos matrimoniais eram diferenciados: nada de “Até que a morte os separe”, mas sim “Até que a morte ou a distância os separe”.

O casamento entre negros não era legalmente reconhecido assim como os casamentos entre gays (...) hoje não são legalmente reconhecidos.

E incontáveis são, em nossa História, os homens e mulheres forçados pela sociedade a se casarem com alguém do sexo oposto em matrimônios armados ou de conveniência ou de puro desconhecimento; séculos de homens e mulheres que viveram suas vidas envergonhados e infelizes e que, através da mentira para os outros ou para si mesmos, arruinaram inúmeras outras vidas de esposas, maridos e filhos – apenas porque nós dissemos que um homem não pode se casar com outro homem ou que uma mulher não pode se casar com outra mulher. A santidade do matrimônio.

Quantos casamentos como estes aconteceram e como eles podem aumentar a “santidade” do matrimônio em vez de torná-lo insignificante?

E em que isso interessa a você? Ninguém está te pedindo para abraçar a expressão de amor destas pessoas. Mas será que você, como ser humano, não teria que abraçar aquele amor? O mundo já é hostil demais. Ele se coloca contra o amor, contra a esperança e contra aquelas poucas e preciosas emoções que nos fazem seguir adiante. Seu casamento só tem 50% de chance de durar, não importando como você se sente ou o tanto que você batalhará por ele. E, ainda assim, aqui estão estas pessoas tomadas pela alegria diante da possibilidade destes 50%. (...) Com tanto ódio no mundo, com tantas disputas sem sentido e pessoas atiradas umas contra as outras por motivos banais, isto é o que sua religião te manda fazer? Com sua experiência de vida neste mundo cheio de tristeza, isto é o que sua consciência te manda fazer? Com seu conhecimento de que a vida, com vigor interminável, parece desequilibrar o campo de batalha em que todos vivemos em prol da infelicidade e do ódio... é isto que seu coração te manda fazer?

Você quer santificar o casamento? Quer honrar seu Deus e o Amor universal que você acredita que Ele representa? Então dissemine a felicidade – este minúsculo e simbólico grão de felicidade. Divida-o com todos que o buscam. Cite qualquer frase dita por seu líder religioso ou por seu evangelho de escolha que te comande a ficar contra isso. E então me diga como você pode aceitar esta frase e também outra que diz apenas: “Trate os outros como gostaria de ser tratado”.

O seu país – e talvez seu Criador – pede que você assuma uma posição neste momento. Um pedido para que se posicione não numa questão política, religiosa ou mesmo de hetero ou homossexualidade, mas sim numa questão de Amor. (...) Você não tem que ajudar ou aplaudir ou lutar por ela. Apenas não a destrua. Não a apague. Porque mesmo que, num primeiro momento, isto pareça interessar apenas a duas pessoas que você não conhece, não entende e talvez não queira nem conhecer, é, na realidade, uma demonstração de seu amor por seus semelhantes. Porque este é o único mundo que temos. E as demais pessoas também contam."

Lucidez é uma característica cada vez mais rara. Cabe aqui o mesmo crédito inicialmente dado pelo João ao Pablo Villaça, do blog Diário de Bordo, primeiro a dar a notícia e responsável pela transcrição e tradução do texto de Keith.

13.11.08

Barack Obama facts

Ou: O novo anticristo segundo alguns evangélicos (não riam)

As pessoas que me conhecem são praticamente unânimes ao afirmar que sou um cara sensato, cordial, compreensivo e bastante tolerante. Não chego a fazer um esforço para que isso seja verdade, mas as vezes conviver demanda alguma dose de paciência. Embora não tenha confirmado se trata-se de brincadeira, aprendi que a mente desprovida de critério racional é capaz de acreditar até em papai do céu, andei lendo por aí que, segundo os crentes protestantes, o anticristo seria o novo presidente eleito americano, Barack Obama.

Nesse lado do globo gozamos de relativa liberdade para falarmos o que quisermos, mas certas coisas conseguem ser tão aviltantes ao intelecto que fica difícil respeitar alguém assim. Na mesma linha de "raciocínio" do blog acima, colhi essa pérola de ignorância no orkut, mais precisamente na comunidade Barak Obama --anticristo--, postada pelo usuário ♪Jocimar. Leiam e tirem suas conclusões...

- - -

Oito Fatos Importantes

1 - Obama é canhoto. A Bíblia, notadamente, identifica a esquerda com as forças demoníacas, e como culpá-la, se a esquerda é em geral só traz mesmo desgraça? O Diabo é canhoto. Obama também.
Tipo essa esquerda/situação que temos no poder? Sou quase obrigado a dar o braço pro tal Jocimar dar um quebramento se não soubesse o medievalismo inquisitivo por trás disso. A palavra em latim para canhoto é sinistra, segundo os antigos católicos característica do diabo.

2 - Segundo o livro do Apocalipse, a Besta "surgirá do meio do mar". Onde nasceu Obama? Nas ilhas do Hawaii, no meio do oceano pacífico.
Fiquei até constrangido por ele agora... vou até evitar dar resposta a isso.

3 - O nome de Obama é quase idêntico ao do maior inimigo do mundo livre judaico-cristão, Osama. O S, de Serpente, é trocado pelo B... De Besta. Como sabem os cabalistas, letras e números não são jamais casuais. Nada é coincidência.
Gostei desse sincretismo transcendental. Na mesma gamela estão protestantismo, numerologia e cabalismo para justificar o rótulo. Então todo Santana é um Satanás por aproximação?

4 - Disse Jesus (Mateus 7:15-23), "Cuidado com os falsos profetas que vem em roupa de ovelha, mas por dentro são lobos vorazes. Por seus frutos os reconhecerão." Obama é simpático, cordial, sorridente, calmo. Uma ovelha. Mas, por dentro? Notem ainda que Obama se anuncia a si mesmo como uma espécie de Messias, vejam o que ele disse em discurso recente: "Uma luz brilhará através daquela janela, um raio de luz descerá sobre você... Você experimentará uma epifania... E descobrirá que deve votar em Obama." (7 de janeiro).
Se todos os calmos, sorridentes e cordias são suspeitos de serem o anticristo, então é característica dos verdadeiros cristãos serem desrespeitosos, destemperados e mal-educados? Hmmm... começo achar que o Jocimar não está TÃO errado assim... Se ignorância dói, levar a Bíblia à sério mata.

5 - Já várias pessoas, especialmente mulheres, desmaiaram em discursos do Obama. Emoção... Ou possessão demoníaca? Quando as frases do Obama durante cada desmaio são escutadas ao contrário, revelam mensagens perturbadoras...
Então todo show do Babado Novo, Ivete Sangalo e etc. são provas de possessões demoníacas. Basta notar o setor das ambulâncias o número de endemoniados. Outra: essa de mensagem ao contrário já deu, hein? Tenho observado que estão levando essa moda de revival anos 80 longe demais.

6 - Diz o Apocalipse sobre a Besta que "o dragão lhe deu seu poder e seu trono, e grande autoridade". Obama poderá ser o futuro presidente dos EUA. O dragão talvez seja uma referência à China, indicando que os EUA suplantarão os chineses, e Obama governará não apenas os EUA, como o mundo.
Do jeito que o nível de desemprego, despejos e dívidas acumuladas pelo tesouro nacional americano ao comprar o lixo do mercado dos bancos, acho meio difícil que a economia se erga somente pela entrada de um novo governante. Acho que o anticristo vai ter que deixar seus planos de dominação mundial para outra hora.

7 - os eventos do Apocalipse culminam com a destruição de Jerusalém. A política de Obama e seus assessores parece ser bastante crítica a Israel, e pretendem dividir a Cidade Sagrada, o que certamente resultará em guerra.
Não foi o que saiu na mídia recentemente. Parece que cristãos ortodoxos armênios e gregos estão mais inclinados a sair no tapa por um pedaço de terra poeirento e bastante desimportante só pelas diferenças de credo. E não limita-se apenas a esses dois países o belicismo religioso cego.

8- segundo a Bíblia, o Anticristo não teria "desejo por mulher". Obama, segundo estas acusações veiculadas no Youtube, seria homossexual, e teria realizado sexo oral quando era senador por Illinois.
Essa foi a que eu achei mais suja de todas, o vilipêndio gratuito de um homem motivado apenas por suas supostas inclinações sexuais. Primeiro que isso não é indicativo de incompetência. Segundo que não há provas disso e mesmo se houvesse não mudaria nada. Toda forma de preconceito é tão danosa ao nosso tecido social que só mesmo através da fé que maus atos podem ter continuidade histórica e ninguém se dar conta disso.

- - -

Aí fica complicado demonstrar algum respeito. Sou obrigado a tentar dissimular o risinho sarcástico cada vez que alguém vem me falar de suas crenças, em especial a ala evangélica da cristandade... E está cada vez mais difícil.

5.11.08

Barack Hussein Obama

Gosto muito desses video, mais uma vez contribuição do FBI para a divulgação da secularidade e do ceticismo, onde o novo presidente americano Barack Obama mostra que mesmo um cristão praticante pode sim ter um discurso secular e de bom-senso.


E ele nem citou minha parte favorita da Bíblia: Números 31...

É claro que ele como político tem sua dose de demagogia, aquela indispensável dentro desse âmbito. Todavia, sua lucidez no trato da religião foi uma das razões que me levou a adotá-lo como votável se eu fosse americano. Como o vídeo é um compilado de melhores momentos de um determinado discurso não é possível julgar todo o homem político por esses trechos, mas já é uma medida de que mudanças virão na maior economia do planeta.

Haja vista o contraste absurdo em relação ao seu antecessor, George W. Bush, que só não era mais anti-laicista pois teria que disputar espaço com sua anti-ética para ganhos financeiros em países médio orientais. Ou com o já mencionado aqui novo livro do Edir Macedo, onde conclama os evangélicos para formar um governo de coalizão sincrético conservador. O que me leva a questionar a balança sutil entre lucidez e moral de todos aqueles que seguem a doutrina protestante e, por inércia ou descaso, apoiam atos dilapidadores da ordem social e questionáveis em todas as esferas onde terá contato. Sad but true, como canta James Hetfield.

28.10.08

Lula Vieira — A Vitória de Gabeira

A sociedade da informação é assim. A gente recebe dezenas, às vezes centenas, de e-mail todos os dias. Filtrar aquilo que é importante daquilo que é SPAM é uma tarefa das mais ingratas, ainda mais para quem trabalha direto na interface de um webmail, no meu caso o Hotmail. Recebi de um amigo meu um texto que seria do Lula Vieira, publicitário que eu adimiro muitíssimo, falando como foi trabalhar com o candidato à prefeito do Rio, Fernando Gabeira, durante esses meses pré 1º. e 2º. turnos. Como minha veia cética não seca nunca, fui atrás de uma confirmação da veracidade da carta e topei com o blog Balaio do Kotscho, do jornalista paulistano Ricardo Kotscho, amigo do próprio Lula. O Vieira, não aquele de quem todo mundo nessa eleição era amigo...

Abaixo segue a carta conforme me foi enviada por e-mail, mas ainda assim deixo os créditos para o Ricardo Kotscho, que primeiro postou o material. Grafei alguns pontos interessantes por minha conta. Essa é também a minha última postagem acerca das eleições desse ano. A anterior, a da massa de bolo, foi meio que impregnada de indignação. Essa vai ser embalada em adimiração, tanto pelo Gabeira quanto pelo Vieira. Curtam o texto.

- - -

"Escrevo ao meio dia de domingo, antes de encerrar a votação aqui no Rio de Janeiro, com as pesquisas de intenção de voto indicando empate técnico entre os dois candidatos a prefeito, Fernando Gabeira e Eduardo Paes.

Trabalhei para Gabeira desde quando ele tinha 4% das intenções de voto e era um candidato tão pequeno que nem mereceu ser entrevistado pelo RJTV, que restringia o supremo prestígio de ser ouvido pelos repórteres àqueles que tivessem algo acima de 5% das intenções de voto.

Invariavelmente Gabeira aparecia na condição de "outros" quando os jornais e as emissoras de televisão falavam dos candidatos. O que mais ouvi neste mês de agosto foi que sem dúvida Gabeira era o melhor nome para a Prefeitura, mas que infelizmente não teria a menor chance.

Os eleitores mais conscientes tratavam de escolher "o menos pior" entre os que poderiam ganhar, Jandira Fegali, Bispo Crivella e Eduardo Paes. Essa difícil e desanimadora escolha ficava entre Jandira e Paes, pois "Crivella nunca", pelo menos na ótica – como eu já disse – dos mais conscientes. Ou dos mais bem informados, sei lá.

Uma revista semanal, acredito que a IstoÉ ou Época (Veja tenho certeza que não foi) chegou a apelidar Gabeira de "Candidato Carrossel" por girar, girar, girar e não sair do lugar. Fui procurado pela mulher de Gabeira, Neila Figueiredo, e selamos o trabalho em conjunto no dia do velório de dona Ruth Cardoso, no aeroporto Santos Dumont, que permanecera fechado durante toda manhã.

Teria total liberdade, desde que não resolvesse criar um Gabeira de mentira. A restrição a qualquer tipo de maquilagem ia até mesmo à própria maquilagem. "As rugas são as marcas do tempo no rosto dele, devem ficar". Não seria necessária a advertência. Mas fiquei contente por ouvi-la.

Acho que os marqueteiros são responsáveis pelo esvaziamento do conteúdo verdadeiro dos candidatos, embora não tenham culpa na falta de caráter e na compulsão pela mentira. Essas características o sujeito já traz de casa, ou de berço, como queiram.

Dias depois, na minha casa, traçamos o rumo da campanha: não atacar o adversário, ser absolutamente transparente, não sujar a cidade. A transparência deveria ir até mesmo no caixa da campanha: nada de Caixa 2, não receber dinheiro de companhia de ônibus nem de cooperativa de taxi, pagar e receber tudo "por dentro" e colocar todas as movimentaçõs imediatamente na Internet.

Se você for até o site da campanha vai achar lá o ítem "Ebulição". É a nossa empresa. Todos os pagamentos que recebemos (e pagamos os impostos) estão lá. Para os padrões brasileiros, o dinheiro da campanha era quase pobre.

Como vantagem tínhamos a melhor equipe que a ideologia pode comprar: Moacir Góis na direção do programa de televisão, João Paulo na edição, Moacir Padilha dirigindo o rádio, Carlinhos Chagas na redação, e por aí afora.

Gente que se dispôs a trabalhar por menos da metade do que poderia cobrar, mas que se sentia recompensada pela oportunidade de se engajar na campanha de um candidato digno, limpo, idealista, agradável.Coisa raríssima nestes dias que correm.

Uma noite, logo nos primeiros dias, o Campanelli da MCR apareceu com um jingle de estarrecedora simplicidade, mas com potencial de se tranformar num mantra: "O Rio é de Gabeira… Gabeira… Gabeira" num ritmo classificado de "marchável", meio hip hop, um chiclete de ouvido irresistível.

Fizemos um santinho, uma equipe se encarregou do site, nos concentramos nos programas de TVe rádio e entregamos a Deus, que com certeza deve ter pensado "Crivella nunca". Tanto é verdade que Crivella, que vinha liderando as pesquisas, se envolveu com o escândalo de uma obra que se chamava "cimento social" e serviu como pá de cal para suas pretenções, com perdão pelo trocadilho.

Teve até a participação de um militar alucinado que entregou uns garotos para serem chacinados por uma gangue do tráfego. Tudo respingou no Bispo e no seu discurso messiânico de ungido pelo céu e por Lula. Só no discurso dele, pois ambos não quiseram se comprometer.

Tivemos a imensa vantagem de termos bom tempo na TV e no rádio, cerca de cinco minutos, e de não sermos ameaça para ninguém. Por isso pudemos apresentar Gabeira com toda calma, como alguém capaz de ter uma visão mais aberta, mais moderna, mais cosmopolita para os imensos problemas da cidade.

Eduardo Paes veio como o grande síndico que se preparou durante dezessete anos para ser prefeito. Dizia conhecer cada pedra, cada buraco da cidade. Prometeu instalar 40 UPAs (Unidades de Pronto Atendimento), uma espécie de Centro de Saúde feito rapidamente e outras coisinhas que transformariam o Rio de Janeiro numa Finlândia em apenas 4 anos.

Jandira, por ser médica, centrou seus esforços na saúde e Crivella era o amigo dos pobres. Jandira parecia ter acabado de acordar no meio de um plantão: nervosa, desgrenhada, vestido aparentemente amassado.

Entre os nanicos, o candidato do PT resolveu transgredir a mais sagrada das normas da televisão e passou o tempo todo falando de lado, para um ponto à esquerda do espectador. Bonitinho, bonzinho, arrumadinho, era o bom filho, o bom colega e o bom professor.

Todos sabem que realmente é um homem direito, mas ficou bonzinho demais, arrumadinho demais. Falou bastante, mas todo mundo se perguntava porque ele olhava para o lado. Chico Alencar é o Chico Alencar, veio de Chico Alencar e falou como Chico Alencar. Levou os votos de Chico Alencar. Meia dúzia.

Os demais se confundiam com os candidatos a vereador. Um deles tinha um belo slogan: "quem pica cartão não vota em patrão". Em conjunto eles iam implantar o socialismo, destruir a Rede Globo e conduzir os povos à libertação, à verdadeira democracia e à divisão justa de renda.

Chega o dia da eleição e, para estupor geral, Gabeira – o candidato Carrossel, o sem chance, o nanico do bem, tira um magnífico segundo lugar e vai para o segundo turno, juntamente com Eduardo Paes, candidato do governador e do presidente.

O espanto maior, no entanto, foi dos institutos de pesquisas que até o dia anterior davam como certa presença de Crivella como adversário de Paes. Neste mesmo dia, Gabeira virou maconheiro, viado, defensor do aborto e da prostituição, nefelibata e tudo mais que é possível se falar contra um político brasileiro.

Só não poderia ser demagogo, mentiroso e ladrão porque no caso do Gabeira é impossível se falar isso dele. Nas primeiras semanas todos os derrotados se aliaram ao Paes, que passou a ser candidato da máquina estadual, nacional e universal (do Reino de Deus).

Lula falou de Paes, Cabral falou de Paes, Crivella falou de Paes, Jandira falou de Paes. Até Molon do PT e Vladimir Palmeira se aliaram a Eduardo Paes. O solitário apoio a Gabeira veio de César Maia, o único prefeito do mundo que surtou e virou blogueiro em pleno mandato.

Quer dizer, vieram dar apoio, além de Cézar Maia, Caetano Veloso, Fernanda Torres, Adriana Calcanhoto, Alceu Valença, Debora Colker, Oscar Niemayer, Gustavo Lins, Alcione, Wagner Moura, Martinália, Pedro Luiz, Marina Lima, João Bosco, Paula Toller, Frejat, Nelson Mota, Armínio Fraga, Aécio Neves e mais oito mil voluntários.

Logo no comecinho me lembro de uma passagem de Gabeira. Um político, dos mais conceituados, propôs a Gabeira começar a mostrar os podres da turma de Paes, um amplo arco de alianças que iam do famoso Piciani a Jorge Babul, passando por uma varidíssima fauna de pessoas sobre as quais não resta a menor dúvida.

Gabeira respondeu: "eu prometi não atacar adversários". O interlocutor não deixou por menos: "então você vai perder". Gabeira respondeu firme: "então eu vou perder". Noutra ocasião, um empresário, que já foi meu cliente, liga oferecendo dinheiro para a campanha. Gabeira instrui o financeiro: "você já sabe, quando empatar com as despesas, pare de receber qualquer dinheiro".

Nunca antes na história deste país um político se dispôs a receber somente o dinheiro necessário para a campanha. Fizeram de tudo, de tudo mesmo, até a suprema burrice: mandar imprimir na Gráfica da Ediouro, de quem sou Diretor de Marketing, um folheto contra Gabeira.

Ninguém acreditou nem vai acreditar, mas tal como Lula, eu não soube de nada, a não ser quando o TRE confiscou o material, que por sinal estava dentro da Lei, com nota fiscal e tudo. Paes ficou repetindo o bordão: "Gabeira é apoiado pelo César Maia, Gabeira é apoiado pelo César Maia, Gabeira é apoiado pelo César Maia".

O engraçado é que todo o currículo de grandes realizações de Paes foi como subprefeito, e secretário… de César Maia. Que raça! No telefone, Gabeira fala de uma vereadora: "ela é analfabeta política…está fazendo política suburbana". Os jornalistas ouvem e dão a notícia.

Mais um bordão: "Gabeira é preconceituoso, Gabeira é preconceituoso, Gabeira é preconceituoso". Milhares de faixas são impressas: "sou suburbano com muito orgulho". Uma feijoada é oferecida aos suburbanos ofendidos e Noca da Portela e outros menos votados dão apoio a Paes, o amigão do subúrbio.

Cria-se uma situação irreal. Gabeira, menino pobre, que vendia banana e ovo para ajudar o pai, professor voluntário na Zona Norte, vira o "candidato dos ricos", enquanto Paes, menino da Zona Sul, estudante de colégios caros e da PUC, quer se consagrar como "o candidato dos pobres".

Paes, 38 anos, cara de garotão é o velho matreiro, conhecedor dos meandros da política, o experiente. Gabeira, 68 anos é o jovem, impetuoso, novidadeiro, contemporâneo. E começam os debates. Até o último, da TV Globo na sexta-feira anterior ao domingo da votação, foram 7 deles.

Gabeira venceu sempre, na opinião dos internautas. Alguns momentos foram muito bons. Por exemplo, quando Paes afirmou que se preparava a vida inteira para ser prefeito do Rio, Gabeira respondeu: "pois eu me prepararei a vida inteira para… a vida inteira".

Ou, então, quando Paes disse que seria necessário saber que "uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa", recebeu como resposta: "a esta altura da vida eu já sei".

Vladimir Palmeira pode nesta eleição ter batido o recorde mundial de ingratidão. Gabeira sequestrou o embaixador americano para que Vladimir, entre outros presos políticos, pudesse ser libertado. E Palmeira decidiu apoiar Eduardo Paes.

Por falar em embaixador sequestrado, a filha do próprio fez absoluta questão de declarar seu apoio a Gabeira. E contou que o pai dela tinha boas recordações dele. Na imprensa escrita, inaugurou-se um novo tipo de colunismo: o de crítica a horário eleitoral gratuito. Como se fosse novela.

O Globo e o Jornal do Brasil tiveram seus colunistas que diariamente comentavam sobre roupa, postura, edição. O colunista do JB, se sentindo obrigado a fazer uma gracinha por dia, algumas vezes se perdeu na busca do humor.

A certa altura, como o programa de Gabeira fazia enorme sucesso com seus clipes de cantores, Paes colocou no seu programa a entrevista de uma jovem na rua que afirmou: "eu quero ver propostas, não musiquinhas bonitas". Nem na Noruega se vê tanta participação cidadã.

Uma jovem exigir dos candidatos a apresentarem suas propostas de governo é tão natural quanto as donas de casa que afirmavam que Paes no seu tempo de sub prefeito entrou na lama até a cintura para ajudar as pessoas assoladas por uma enchente.

Uma enorme demonstração de incompetência de seus auxiliares foi não encontrar uma única foto registrando o heróico feito. Hoje o eleitor decide quem é o prefeito do Rio de Janeiro. O resultado sairá dentro de algumas horas. Seja qual for o vencedor, Gabeira sai muito maior do que entrou.

É um político que pode se orgulhar do respeito de todos, inclusive de seus adversários, que jamais colocaram em dúvida sua honradez e honestidade. Outra vitória de sua candidatura foi a de trazer para milhões de pessoas a informação de que é possível se fazer politica com seriedade.

Trouxe também a participação dos jovens, entre os quais, as pesquisas eram unânimes em apontá-lo como o candidato preferido. Nesta eleição não se ouviu o tradicional discurso do "político é tudo igual", principalmente por parte deles.

Gabeira demonstrou que os políticos, como as pessoas, são diferentes. Sua campanha termina com a marca da elegância, do bom humor e do amor pelo Rio de Janeiro. O Rio foi votar sorrindo. Essa é a grande, a enorme vitória de Fernando Gabeira."

27.10.08

Massa crítica

A massa é crédula. A massa não se preocupa em saber, apenas em acreditar. A massa não tem vontade própria. A massa é moldável. A massa aceita tudo que é dado, sem questionamentos, sem dúvidas e sem escrutínio moral. A massa está isolada em seus rincões bairristas. A massa acha que sabe o que quer. A massa quer somente aquilo que querem por ela. A massa fica alegre com pouco. A massa só reage com muito. A massa só cresce e fermenta em cultos, showmícios e carnaval. A massa é catalizada pelo medo, conduzida pela fé e temperada pela ignorância. A massa simplesmente aceita água para se tornal mais maleável e farinha para se tornar mais dura. A massa é burra, cega e depende inteiramente do padeiro para tomar a forma que tem. A massa não tem consciência do forno que vai assá-la. A massa ignora os garfos que vão espetá-la e das facas que vão dividi-la. A massa não toma conhecimento das bocas que vai alimentar numa festa de quatro longos anos.

22.10.08

Propaganda ateísta nas ruas de Londres

Alguns ônibus de Londres (infelizmente não incluem os charmosos ônibus vermelhos de dois andares) poderão circular a partir de janeiro de 2009 com adesivos nas laterais com slogans de cunho cético, a fim de incentivar as pessoas a pensar um pouco sobre a própria condição humana e religiosa.


A campanha é da BHA — British Humanist Association (Associação Humanista Britânica) e conta com o apoio de Richad Dawkins, um dos maiores nomes entre ateus mundiais e autor de Deus, um Delírio. Todo o budget utilizado para a veiculação foi levantado através de doações e o volume pretendido é de dois grupos de 30 ônibus por duas bi-semanas. Como o orçamento suplantou as espectativas, especula-se o uso de mídia interna nos mesmos ônibus. Até o momento não consegui apurar qual agência publicitária intermediou as negociações de mídia ou se teve alguma participação no desenvolvimento da arte da campanha, mas ficarei atento ao assunto e posto aqui o que descobrir. Ao que tudo indica há uma centralização bem recente (as atividades começaram há uma semana!) na Inglaterra chamada Atheist Campaign que luta para levar à grande mídia suas idéias. Que essa seja a primeira de muitas inserções!

There's probably no God. Now stop worrying and enjoy your life (Provavelmente não existe um deus. Pare de se preocupar e aproveite a vida — tradução livre), é o slogan da campanha seguido da assinatura com a logo da BHA. "Nós vemos tantos pôsteres divulgando a salvação através de Jesus ou nos ameaçando com condenação eterna, que eu tenho certeza que essa campanha será vista como um sopro de ar fresco", disse Hanne Stinson, presidente da BHA. "[Nosso objetivo é] promover o ateísmo na Grã-Bretanha, encorajar mais ateístas a assumirem publicamente a sua posição e elevar o astral das pessoas a caminho do trabalho".

Acho a iniciativa legal e apoio o "atrevimento" de divulgar nosso modo de pensar, mas acredito que esse ato será seguido de espasmos concussivos de intransigência cristã. Poderia apostar o que quisesse que tão logo a capanha esteja na praça, logo será alvo de pixações e depredação do material veiculado, o que será ao mesmo tempo uma pena e um sintoma do preconceito religioso que habita naqueles que se dizem amar ao próximo. É bem verdade que talvez eu morda a língua por se tratar dos ingleses, mas ainda me pergunto o que aconteceria se o mesmo se desse no Brasil ou na proto-teocrática América?

A notícia na íntegra pode ser lida no portal G1. E dou crédito ao Francisco da Ateus & Agnósticos por tê-la postado hoje.

14.10.08

Voltando às origens

Esse vídeo do pessoal do The Atheist Experience me deu uma sensação nítida de déja-vu. Não só pela aparência familiar do âncora Matt Dillahunty, mas também do que foi dito por ele. Revirando meus alfarrábios (na verdade apenas procurei aqui no meu campo de busca) reencontrei a parte dois da minha série de postagens Porque Sou Ateu, onde falo praticamente ipsum literis o que aparece no vídeo.


"E quanto a isso? E se eu for até aí e socar sua cabeça gorda..."

Comparem com um trecho da minha postagem antiga. E aproveitando, créditos e agradecimento pela tradução, legendagem e postagem do vídeo para o FBI. Belo trabalho, filho!

Voltando mais uma vez à definição enciclopédica da palavra ateu que consta na Larousse: "Aquele que nega a existência de qualquer divindade". Para começo de conversa, além de conter o erro ético de empregar adjetivos pejorativos como se fosse verdade absoluta, a definição peca pela imprecisão do termo negar. O fato de alguém ser ateu não necessariamente implica em uma negação da existência de instâncias divinas que atuam no mundo. O correto seria dizer que o ateu nega credibilidade à idéia da existência de deuses pelo fato dela não conter nem sombra de consistência que a faça parar de pé. É um exercício de fé e não de razão acreditar em deuses.

29.9.08

A Aposta de Pascal

Mais uma dos texanos do programa de televisão à cabo americano The Atheist Experience, que recebe ligações de religiosos tentando convencê-los de que milagres acontecem por interferência divina, deuses existem entre outras. Já havia algum tempo que queria escrever algo sobre a Aposta de Pascal (não a linguagem de programação), mas os caras tornariam qualquer palavra minha meramente redundante, pois não sobrou muito muro pra derrubar depois dessa. De qualquer forma, podem conferir esse link para mais detalhes históricos sobre o filósofo francês Blaise Pascal e sua infeliz "argumentação". Está em inglês pois a versão em língua portuguesa é uma mera sombra do completíssimo artigo original.

Depois desse vídeo percebo que sou muito gentil debatendo...

Mais uma vez, crédito para o FBI pelo excelente trabalho de legendagem e distribuição.

22.9.08

Edir Macedo prega que evangélicos tomem o poder

Neste domingo (21/09) o jornal O Globo publicou uma matéria que fala do lançamento do novo livro do Edir Macedo, Plano de Poder, onde ele afirma que deus teria um suposto plano de governo onde a IURD e quaisquer denominações protestantes à ela filiadas, seriam exortadas à apoiar Igreja Universal nessa empreitada rumo ao Planalto.


A jornalista Tatiana Farah entrevistou Roberto Romano, cientista político e professor de ética da Unicamp que afirmou que o momento é propício para o lançamento do livro, mas a liderança de Macedo está longe de ser unânime entre os ceca de 40 milhões de evangélicos no país.

Silvana Suaiden, professora titular de Teologia da PUC - Campinas, disse que Macedo faz uma leitura fundamentalista do Velho Testamento. Ele dá uma relevância descabida ao papel dos evangélicos nessa tomada de poder, deixando de lado de fora os adeptos do catolicismo. Isso em uma época que só haviam hebreus primitivos e judeus, sem nem sombra messiânica da imagem de Jesus.

Ler essa reportagem (também disponível no site do Instituto Humanitas Unisinos) me deu uma sensação desagradável de impotência perante os acontecimentos. Embora realmente uma unipartidarização evangélica ainda é uma utopia dentro das fileiras protestantes, ainda assim têm voz ativa para eleger senadores, governadores e tentar ascender à prefeitura. Realmente a época dos pastores/vereadores com suas ovelhinhas locais acabou e, em face aos prognósticos futuros, deixa saudade.

Talvez isso nem venha a se concretizar, mas é um absurdo um tipo de manobra como essa. E mais absurdo ainda é constatar que cerca de 20 ou 30% da parcela da população brasileira não tem escrúpulos de afirmar que votaria em um candidato apenas pela sua afiliação religiosa evangélica. Basta ver o que está acontecendo em São Paulo com a candidata à prefeitura Marta Suplicy e como ela tem sido alvo da estupidez evangélica daquela cidade.

Aproveitando: sei que é fora do meu domicílio eleitoral, mas como ateu não votaria na Marta apenas porque ela está sendo hostilizada pelos protestantes, como forma de mostrar meu repúdio. Tampouco votaria em um candidato ateu apenas por ele ser ateu, o que seria um erro tão crasso e da mesma família, apenas com sinal invertido, da insólita frase "irmão vota em irmão", que o velho Macedo está tentando levar à um assustador patamar ainda não visto no Brasil.

12.9.08

#4 - MORAL

Moral, basicamente, é o conjunto de regras de conduta, consensos de comportamento e atitude tomadas como sendo adequadas para uma determinada sociedade e em determinado local. Tal definição é relativa pois o tipo de atitude esperada de uma pessoa em geral está em conformidade com a cultura na qual ela está imersa. Não há, pois, um parâmetro pelo qual podemos julgar que determinada ação está correta ou não, apenas que determinada ação está ou não dentro do que consideramos justo, aplicável ou mesmo bom. É, portanto, um valor subjetivo. É possível, entretanto, impor um conjunto de regras a uma sociedade, desde que essa imposição advenha de um poder político forte, de uma sub-cultura influente ou de um ou mais indivíduos carismáticos. Percebam que o fato de que algo é disseminado, influente ou comum não é obrigatoriamente reflexo da verdade.

Levamos milhares de anos de história ocidental para chegarmos ao patamar que estamos hoje. Pode não ser o melhor exemplo do mundo, mas sem dúvida é o melhor que pudemos fazer e o mais inclusivo de todos os códigos de conduta já criados do nosso lado do planeta. Em tempo: excluí o resto do mundo desse grupo pois é sabido que em alguns tópicos eles são muito diferentes de nosso agir e compreender o mundo. Culturalmente são bem divergentes, mesmo que com muitas semelhantes inerentes à nossa espécie. Por esse motivo, e também por familiaridade, optei por estancar apenas no nosso paradigma e na religião com que tenho mais familiaridade, o cristianismo. Após esse longo período de evolução cultural, onde abandonamos práticas hoje tomadas como cruéis e indignas, ainda assim algumas pessoas insistem em uma leitura literal de cânones primitivos e leis ultrapassadas. Nossa sociedade está prenhe de exemplos de códigos de conduta específicos que estão fora de sintonia com o que convencionamos chamar de bom-senso, respeito à vida e liberdade de escolha. As Testemunhas de Jeová tem tradicionalmente um ponto de vista interpretativo das escrituras bíblicas cujo principal reflexo é a intolerância religiosa à doação de sangue e órgãos. Imagino quantas vidas já não foram perdidas em casos onde um simples gesto poderia ter salvo centenas delas anualmente. Há aqueles que acreditam em uma concepção literalista de todo o conteúdo, com uma Terra criada por um ser superior dotado de características divinas e que foi responsável por tudo que existe no universo. Essa mesma discussão foi debatida em júri em Dover, Pensilvânia, EUA, onde protestantes queriam espaço para que suas crenças travestidas de ciência fossem ensinadas em sala de aula junto com a teoria da evolução darwinista. A decisão, aliás, foi a favor dos evolucionistas.

Onde realmente quero chegar é no critério que os religiosos costumam ter para tomar a Bíblia como sendo um reflexo literal da verdade. É comum dentro do dogma de todas as religiões a confiança na capacidade de seus escritos serem totalmente corretos e sábios. Baseado em evidências observáveis, testáveis e reproduzíveis me parece claro que o criacionismo, bem como as partes onde a Bíblia fornece informações de cunho científico estão quase todas erradas. O que é justo já que seu conhecimento está estagnado na idade do bronze, onde pouco se conhecia do mundo além de técnicas agrárias e do fabrico de instrumentos e ferramentas. Histórias fantasiosas e metafóricas como o dilúvio, inferno, o sol de Josué e outras não merecem mais atenção do que como alegorias folclóricas que são. Se o que eles consideram de mais sagrado não é infalível, não representa a verdade, não poderia ser também incompatível com o que conhecemos como moral? Já que a Bíblia é inconteste algo que está muito aquém de ser um guia de biologia, estaria a altura de ser um guia moral?

Eu diria que não. É comum dentro da Bíblia versículos onde são relatados destrato à mulheres (do mesmo jeito que seus primos do Islã...), prega injustiças, constrói valores arbitrários que acabam por arruinar de famílias a cidades, comete e incentiva crueldades contra pessoas e animais e é intolerante contra aquilo que é diferente. Já debati com pessoas que recorreram ao seguinte argumento quando menciono esses fatos: "Mas isso era correto para oa povos daquele tempo. Hoje é bem diferente". Relatividade moral/cultural, lembram? E de onde saiu nosso moderno modo de viver? Por que "hoje é diferente"? Está na Bíblia? Não, não está. Falando a verdade, em todos os lugares onde a religião foi o cerne de códigos morais, foi exatamente onde atrocidades maiores foram cometidas. Sempre em nome de deus.

Desenvolvemos nossa moral, nosso comportamento e nosso estilo de vida fora de qualquer escritura. Através de ramos como filosofia, que nos ajudou a entender o homem. História que nos deu os registros do que deu certo e o que deu errado com nossos antepassados. Ciências como sociologia, psicologia, biologia que nos forneceram pistas sobre quem somos na realidade. Pressões sociais expontâneas. Política. Comunicação. Isso sim formou nossas diferentes morais modernas e garante que podemos existir em um Estado de laicismo absoluto sem intervenções infantis de crédulos atemorizados pelo que não conhecem. Chamar a Bíblia de livro santo ou de guia moral é uma afronta à decência e a dignidade. Pretender que ela seja a verdade absoluta é subestimar o intelecto humano*.


*Retirado do site Bíblia da Cético.


- - -
Parte 1 - DEFINIÇÃO
Parte 2 - ORIGENS
Parte 3 - EVOLUÇÃO
Parte 4 - MORAL

31.8.08

The Atheist Experience

Quebrando o gelo que se formou pelo período extenso de inatividade do blog. Esse início de semestre tem sido bem desgastante e as postagens já escassas tornaram-se erráticas, agora com quase dois meses de entresafra. Mas já poderei retornar aos poucos à velha faina de divulgar pensamentos críticos e idéias céticas. Semana que vem concluo a parte 4 das minhas conclusões e vivências dentro da religião. Por hora, deixo vocês com uma pérola até bastante comum quando o assunto é debate teísta x ateus: contradição.

Através do usuário FightBadIdeas, responsável por legendas de vídeos de cunho cético no YouTube, incluindo aí uma série de vários vídeos do humorista inglês e crítico da religião Pat Condell, pude conhecer o The Atheist Experience.

Dois senhores tiros no próprio pé, diga-se...

O programa de TV a cabo de Austin-TX, propõe discussões ao vivo por telefone com telespectadores, geralmente teístas, é produzido pela Atheist Community of Austin, que trabalha para popularização e desmistificação do ateísmo naquela parte dos Estados Unidos. Não sei como não conhecia-os, mas deixo registrado aqui meu agradecimento ao FightBadIdeas pelo esforço e dedicação para a popularização desses vídeos em português.

6.7.08

#3 - EVOLUÇÃO

Não mudei como pessoa apenas porque abandonei as fileiras do cristianismo protestante. Minha moral e meus valores foram construídos quando jovem. Tive uma boa formação intelectual, com meus pais me incentivando ao hábito da leitura desde muito cedo. Talvez tenha sido isso um dos fatores que tenha ajudado a derrubar o muro que me separava da realidade: uma habilidade desenvolvida de querer sempre buscar a verdade ao invés de simplesmente me contentar com o que me era oferecido. Às vezes acho engraçado (quando não triste) uma pessoa religiosa bater de frente com questionamentos inteligentes acerca de sua crença e, mesmo perante argumentos incisivos, fortes, embasados em provas muito bem documentadas, consegue colocar parelhas e agarrar-se desesperadamente à sua fé e negar evidências. E isso, entre seus pares, é considerado uma virtude!

Embora o ateísmo não contenha nenhum conjunto de valores ou filosofias específicas agregados em seu conceito mais elementar, uma coisa muito boa serviu de espólio após minha ruptura com a religião: desenvolvi minha "espiritualidade", embora o termo não combine muito bem com aqueles que descrêem por razões de ordem racional, acho que ainda há espaço para exercitar o que eu prefiro chamar de propósito adiquirido, diferente de um propósito mais transcendental que muitas religiões chamam de karma ou destino. E de forma muito mais honesta.

Não há uma resposta satisfatória para o que viemos fazer no mundo. A alternativa religiosa padrão "adorar a um ser maior do que nós" é no mínimo acomodada demais, fraca demais ou subserviente demais, digna de quem nasce e morre adestrado para ser lacaio de mulás, rabinos, bispos etc. O ponto de vista estritamente biológico de "reproduzir e evoluir" acaba sendo um pouco frustrante para quem não está preparado para a simplicidade orgânica da vida ou de nosso mero suspiro perto do tempo geológico ou das mensuras espaciais. Deve existir outra coisa.

Gosto de pensar (pelo menos faz sentido subjetivamente, talvez não sirva para todos) que exercito minha "espiritualidade" através da simples busca pelo prazer. Só isso, uma filosofia hedonista orientada. Já que vivemos, que essa existência seja melhor possível, daí buscamos parceiros, desenvolvemos amizades, inventamos crenças e criamos tecnologias para tornar nosso mundo palatável, desviando-nos da dor, da necessidade, das deficiências que nossos pobres corpos carbônicos e suas necessidades carnais. E por último, como elemento regulador, a humanidade. A capacidade de se pôr no lugar de outro. De imaginar sua dor, de se alegrar com seu prazer, de ajudar em sua necessidade.

Parece ser lugar comum dizer que só a religião pode trazer bondade ao coração humano, ou que só através do amor a um ser mágico e presumidamente superior somos capazes de fazer o bem. Mas sempre sob pena de ir para um lugar ruim ao morrer, caso nossa conduta não seja ilibada, perfeita. Então o bem é feito para agradar esse ser mágico para que o mesmo nos agracie com uma pós vida cheia de prazeres, seja com paz eterna, gozo infinito, companhia de antepassados fartando-se em um banquete à mesa de reis ou numa alcova celestial lasciva de 72 virgens? O religioso então só faz o bem objetando uma recompensa? Que espécie de egoísta interesseiro desloca seu próprio rabo para projetos sociais, esmola e faz sopões para distribuir para moradores de rua com os olhos cintilantes voltados para seu próprio umbigo, centro gravitacional da criação? Se o raciocínio de que sem um deus não há motivo para fazer o bem, digo: "Contine com sua fé, amigo, por favor! O mundo agradece por ter menos um psicopata graças ao sedativo metafísico da religião."

- - -

25.6.08

The Deep

Enquanto termino a continuação da minha postagem sobre "meu" ateísmo e batalho para terminar de corrigir pilhas de provas e trabalhos, deixo uma dica para quem gosta de biologia, evolucionismo e acha que perdeu em algum lugar a capacidade de se assombrar e maravilhar com a variedade de formas de vida que existem no nosso planeta.


The Deep: The Extraordinary Creatures of the Abyss, é um livro de fotografias da jornalista e diretora de documentários Claire Nouvian, que percorre o mundo há mais de dez anos para filmar séries sobre animais. Vejam a galeria de fotos, que é sensacional!

Sua paixão pela fauna submarina e pelo mergulho, levou-a a especializar-se neste domínio. Participou na escrita e realização do filme Microcéan, escreveu Océanoutes, um documentário sobre a conquista das profundezas e realizou um documentário científico, Expédition dans les Abysses, sobre a reciclagem das carcaças das baleias no fundo dos mares. Em Outubro de 2005 foi correspondente da missão oceanográfica do Instituto de Investigação Harbor Branch, no Golfo do Maine. Recebeu vários prémios como escritora e realizadora de vários filmes.

Simplesmente PRECISO comprar esse livro, que infelizmente não foi traduzido para o português. Vou ter que morrer em uma grana na Amazon...

1.6.08

#2 - ORIGENS

Voltando mais uma vez à definição enciclopédica da palavra ateu que consta na Larousse: "Aquele que nega a existência de qualquer divindade". Para começo de conversa, além de conter o erro ético de empregar adjetivos pejorativos como se fosse verdade absoluta, a definição peca pela imprecisão do termo negar. O fato de alguém ser ateu não necessariamente implica em uma negação da existência de instâncias divinas que atuam no mundo. O correto seria dizer que o ateu nega credibilidade à idéia da existência de deuses pelo fato dela não conter nem sombra de consistência que a faça parar de pé. É um exercício de fé e não de razão acreditar em deuses.

Suponha que um homem que você nunca viu na vida lhe aborda na rua educadamente e propõe o seguinte negócio.

"Amanhã nesse mesmo horário você me empresta 10 mil reais, ok? Dou-lhe minha palavra que será devolvido em uma semana no máximo com uma boa gratificação, evidentemente! O que me diz? Temos um acordo?".

Evidentemente que nem a pessoa mais estúpida do planeta engoliria essa história e é perfeitamente normal se questionar quanto aos termos da proposta: Que garantias ele dá para que você confie nele? Porque ele está fazendo essa proposta tão informalmente? Como confiar em um estranho uma soma tão alta? Note que você não o está acusando de ser desonesto, apenas que ele não goza junto à você de credibilidade. Talvez ele seja realmente um investidor honesto e disposto a compartilhar com você um bom lucro instantâneo. De qualquer forma cabe à ele provar isso a você, ou então nada feito. Procedimento semelhante é empregado por ateus ao negar credibilidade ao conceito de divindades. Que aqueles que crêem provem que estão certos, se puderem. À essa imputação de dever provar os advogados chamam de ônus da prova, que nada mais é que uma ferramenta de lógica argumentativa. Resumidamente é usada para definir quem é a pessoa responsável por sustentar uma afirmação ou conceito, no caso aquela que o faz primeiro. Uma definição simples e sem jargões de advocacia pode ser encontrada aqui.

Em 6 mil anos de história humana nenhuma migalha de prova foi oferecida como forma de defender a existência de deuses. Nada mesmo. Todas as experiências sobrenaturais alegadas como verídicas acabam por terra quando submetidas a uma análise mais cuidadosa. Vida após a morte, milagres, intervenções, curas e visões nunca passaram realmente de uma fantasia, no caso dos mais criativos, de ingenuidade por parte dos crédulos e má-fé daqueles que usam o conceito do divino para fins próprios.

Como deixei de acreditar há muito em bicho-papão e Papai Noel (tampouco tive amigos imaginários, só reais), não cabe a um adulto sadio e inteligente dar mais crédito às historietas religiosas do que uma mera manifestação cultural. Além do mais, como saber qual das milhares de crenças existentes no mundo aquela que é a verdadeira? Pode-se até concluir que a condição religiosa é mais um acaso do que uma opção em si. As chances alguém nascido no Brasil seguir algum dos ramos do cristianismo ocidental por influência dos pais, escola e outros stakeholders sociais é bem grande. Agora, tivesse você nascido no Afeganistão, suas certezas seriam outras, seus dogmas seriam tais que certamente entrariam em conflito com sua "verdade" atual.

Se a religião é uma besteira sem sentido e assincrônica em nossa moderna concepção de realidade, o que sobra para compreender o mundo em que vivemos?

Ciência, das mais variadas áreas e escopos, abrangendo um espectro imenso e praticamente total da condição humana. Aí você me pergunta "o que faz a ciência ser correta? Porque ela merece crédito?" Por causa do Método Científico; a lógica aplicada à pesquisa acadêmica. A partir da observação de determinada fenomenologia, o pesquisador elabora uma hipótese e passa a tentar quantificar, mensurar, anotar tentativas, experimentar e comparar até chegar a alguma conclusão. É um trabalho tão complexo e estruturado que mesmo quando uma hipótese se mostra errada, ela ajuda a ciência a caminhar, uma vez que evita que todo o processo se repita desaguando nos mesmos resultados negativos, desperdiçando recursos. Tais resultados são publicados detalhadamente em revistas e periódicos, estando disponíveis para qualquer cientista no mundo aproveitar ou contestar os resultados obtidos através do peer review. Nesse último caso, haverá intensa pesquisa até que as provas apareçam e levem o conhecimento a um novo patamar mais evoluído. Pode acontecer que talvez não consiga provar o contrário, o que acaba por validar ainda mais as teorias envolvidas.

Se você acredita em deus, é grande a probabilidade de que você ache que sou um herege, já que não respeito a religião (no máximo aceito o direito de credo de alguém, mas nunca o objeto de sua crença). Se você buscar a origem do termo heresia verá que ela descende de uma palavra grega que significa escolha. Tomar determinada mitologia como sendo parte da realidade pode até servir muito bem para aquelas pessoas que não tem um compromisso muito sério com a racionalidade. Não que isso tenha alguma coisa a ver com opção mas com imposição, afinal a grande maioria dos crentes está preso à uma rede de valores socio-culturais que nos é imposta desde muito cedo. Uma tradição ingrata perpetrada geração após geração.

- - -

14.5.08

Entressafra

Estou em débito comigo mesmo (é, eu sei que praticamente ninguém vem aqui. Acompanho as estatísticas de acesso), já que minha série sobre ateísmo está atrasada mais de um mês. Isso se deve a vários fatores como falta de tempo, inspiração e revezes tecnológicos como uma conexão instável (já resolvida) e problemas na minha máquina (também já sanados). Ao que tudo indica em breve volto a postar com freqüência.

8.4.08

#1 - DEFINIÇÃO

ATEU adj. e s.m. (Do grego atheus, sem Deus.) Que ou o que nega a existência de qualquer divindade; ímpio. (LAROUSSE, pág.499)

- - -

Fica claro para qualquer um que interprete razoavelmente textos de ensino médio que ateu é, portanto, um adjetivo e substantivo masculinos formado pelo prefixo grego a, significando "ausência" e o radical teu, derivado do grego theós, significando "deus"; sinônimo também de impiedoso, desumano e cruel!

Não costumo ler dicionários ou enciclopédias nas horas vagas, mas faço uso deles com freqüência e não me lembro de nenhum verbete em nenhuma publicação do tipo fazer um juízo de valor acerca de seu significado. Mas não vou me ater a isso agora. Haverá espaço nas próximas partes dessa série de postagens (ORIGENS, EVOLUÇÃO e MORAL) quando vou discorrer o quanto essa afirmação é preconceituosa e incorreta. Por hora vou me concentrar na definição básica do termo e algumas implicações anedóticas práticas.

Sim, ateu é aquele que não acredita em instâncias sobrenaturais superiores. Agora, por que não acreditamos nisso? Bem, isso sim é bastante complexo de responder. Para falar a verdade, há tantos tipos de ateus quanto há ateus, pois nenhum de nós segue alguma doutrina específica ou filosofia de vida comum. Geralmente a ruptura com a religião ocorre em momentos diversos e sob condições diversas, tornando impossível uma categorização.

Quanto ao tema a maioria tende a ser cética, requerindo provas para que se possa afirmar que um deus exista. Chame isso de coerência contra a credulidade, algo que nos acostumamos a ter sempre à mão e que nos protege no dia-a-dia mas que por motivos de tradição e autoridade autoimposta pelos credos e crenças, não é aplicada aos mesmos. Tentam assim tornar-se imunes à críticas. Mas após milênios de história humana e centenas de civizações ao longo da linha temporal nada que tenha sobrevivido ao crivo impiedoso da ciência sobrou, de modo que a questão ainda é a mesma: ainda é muito mais fácil e reconfortante ficar à sombra de um mito do que cavar sob o sol em busca da verdade.

Há aqueles que por não terem suficiente desenvolvimento intelectual não podem posicionar-se quanto ao conceito de divindades. Soou arrogante? Talvez, pelo menos até você admitir que ninguém nasceu acreditando em alguma coisa, certo? Crianças não têm maturidade para decidir-se sobre tais assuntos, mas são adestráveis o suficiente para aprender sem questionar qualquer tipo de conteúdo. De fato são atéias até que ensinadas a observar certas tradições de sua comunidade, normalmente o dogma de seus pais. Culturas isoladas que não desenvolveram a abstração ao nível da adoração metafísica também são exemplo de que é possível viver todo um ciclo vital sem crer em deus. Há uma historinha interessante da escritora norte-americana Annie Dillard que ilustra bem essa situação

Esquimó:
"Se eu não soubesse nada sobre Deus e pecado, eu iria para o inferno?

Missionário:
"Não, não se você não soubesse"

Esquimó:
"Então por que você me disse?"


Há até aqueles "ímpios" que rejeitam a idéia de todos os outros deuses já criados pelo homem... menos o próprio! Pense comigo: se você é um cristão (com ou sem Papa) acredita na existência de Jesus Cristo de Nazaré, messias de Jeová e mártir dos judeus, o deus vivo dos antigos hebreus e essênios(?). Automaticamente acha que todas as outras manifestações religiosas no mundo não passam de um monte de mentiras, correto? Se esse é seu caso então há muitíssimas diferenças dogmáticas entre você e os seguidores de Tezcatilpoca, Allah, Odin, Zeus, Júpiter, Amon-Rá, Dagda, Marte, Cronos, Vesta, Aa, En-Mersi, Assur, Atena, Mami, Nin-azu, Qarradu e etcéteras mas há uma grande semelhança: de um vasto universo de divindades criadas pelo homem à sua imagem e semelhança cujo número certamente anda na casa das milhares, você acredita em pelo menos um. Como de minha parte não vejo motivo para acreditar em nenhum, estatisticamente falando a diferença tende a zero.

- - -

4.4.08

Por que me tornei ateu?

Quando comecei a escrever o Caneca Orbital a proposta inicial era ser apenas um blog despretencioso sobre ateísmo. Queria citar bons autores da área sempre que possível, noticiar discussões que foram surgindo na comunidade Ateus & Agnósticos e exemplificar situações que deixam clara como a religião organizada é uma forma nada sutil de dominação ideológica e até com bastante freqüência, política.

Vez ou outra compartilho algumas nuances pessoais que, ao meu ver, não desvirtuam muito o tema da comunidade. Nessas pílulas particulares não cheguei a tecer muito profundamente o modo como cheguei às minha conclusões. Se o fiz, foi de forma sutil e, de qualquer forma, espalhado por trinta e poucas postagens. Como um bate-papo informal, onde a conversa vai vagando por assuntos vários, passando longe às vezes da seriedade que o assunto exige.

Ligado à essa vontade de me abrir, o aumento quantitativo de visitantes ao longo do tempo me fez pensar qualitativamente em quem anda lendo meu conteúdo. Entre esses novos (ainda poucos) visitantes há amigos próximos, amigos de profissão, amigos de monitor e amigos de sala, meus alunos. Sobretudo esses últimos despertam uma importância e responsabilidade maiores, já que sou de certa forma um formador de opinião deles. E para tanto sinto necessidade de responder sob o meu ponto de vista cada umas das quatro perguntas básicas abaixo, uma por postagem, ao longo das próximas semanas:

DEFINIÇÃO
O que é ser um ateu?

ORIGENS
O que envolve o não acreditar no sobrenatural e encarar a realidade buscando apenas na matéria fatos para explicá-la?

EVOLUÇÃO
Desde que me descobri ateu, o que mudou na minha conduta, postura, ética e modo como me relaciono com as pessoas?

MORAL
Como posso esperar que respeitem alguém que pensa de forma radicalmente diferente da grande maioria, se a única referência da minha maneira particular de ver a vida é uma palavrinha escrita no meu perfil do orkut e que raríssimos sabem realmente o significado?

22.3.08

Soberania da Intolerância [2]


Na Nigéria e na lusófona Angola, certamente isso se repete em outros países do continente africano, um fenômeno de barbarismo e ignorância tem chamado atenção desde o ano 2000. Pastores evangélicos locais estão ajudando a criar uma terrível campanha de violência contra jovens membros de sua vizinhança. Crianças e até mesmo bebês são acusados de serem praticantes de magia negra e, portanto, passíveis de serem agredidos, abandonados e assassinados enquanto os líderes religiosos enriquecem por meio do medo dos pais e do povo local. Mesmo havendo uma concorrência muito grande entre as centenas de denominações evangélicas na área, o mercado é lucrativo para aqueles que se aproveitam da ignorância bovina daqueles que crêem no seu dogma.

A motivação parece ser tão casuística quanto desmedida, pois basta que ocorra um divórcio, doença, acidente ou perda de emprego para que tais medidas logo encontrem acolhida no seio dessas igrejas como sendo obras de bruxaria, prática que faz parte não só do credo como também da própria cultura africana e que os cristãos fazem questão de erradicar, usando para isso os métodos mais sádicos e cruéis possíveis, que faria corar de vergonha virginal qualquer inquisidor espanhol mais sanguinário.

Aplicação de jindungo (uma espécie de pimenta), perfume e até petróleo nos olhos da criança, óleo de palma nos ouvidos, cortes na pele, queimaduras de fogo, ácido ou água quente, supositórios de ervas, eméticos por via oral e anal. O exorcismo não sai barato, já que a família tem que pagar ao pastor de três a quatro meses de salário para que o demônio/feitiçaria seja expulso do corpo da pobre criança. Outras são postas em regime de trabalho forçado nas lavras do pastor por períodos de cerca de seis meses. Muitas vezes a criança acaba não resistindo aos maus-tratos e acaba morrendo. As que conseguem escapar à fúria estúpida dos religiosos acaba morando na rua, agravando o quadro social de miséria e abandono que já é bem grande em todo o continente.

Leia aqui a reportagem do caso Nigeriano do jornal inglês The Observer. Na mesma página da reportagem há um vídeo que mostra detalhes do ocorrido, mas uma versão legendada pelo Cristiano *o|-<( da comunidade Ateus e Agnósticos faz o grande serviço de divulgar essas atrocidades e torná-las mais acessível aos que não falam inglês. Procurando saber mais sobre o assunto acabei achando também outra matéria, essa da agência angolana AngoNotícias, que relata casos semelhantes também ocorridos em Angola.

Embora profundamente revoltado, não vejo novidade nessas atrocidades em nome do cristianismo. Suas raizes profundas que também levam seiva conspurcada para o judaísmo e o islamismo, estão mergulhadas em pouco mais de dois milênios de guerras e sangue inocente. Seu mártir, que supostamente fora torturado antes de ser morto, dizia-se filho de uma divindade arcaica que serviu de pretesto sobrenatural para matanças tão torpes e cruéis como as que estão sendo feitas na Nigéria e em Angola. Crianças sempre pagaram com a vida por adultos fanáticos e suas alucinações bárbaras e primitivas.

17.3.08

Soberania da Intolerância

Domingo passado (16/03) saiu uma reportagem interessante no jornal carioca Extra sobre como algumas igrejas neopentecostais sediadas em favelas no Rio de Janeiro estão se aliando a traficantes em uma estranha simbiose de fé. Os traficantes membros dessas igrejas estão coagindo, ameaçando e expulsando freqüentadores de terreiros de culto afro presentes nas comunidades. Em troca, as igrejas prometem bênçãos, salvação eterna e perdão dos (muitos!) pecados cometidos pelas suas ovelhas negras.

O jornal apressou-se a deixar claro que são igrejas independentes. Evidentemente as últimas ações da IURD tentando um golpe sincronizado de censura através de ações judiciais ainda estão muito frescas na memóra do meio jornalístico. Já nessa segunda-feira (17/03) o caso deverá parar nas mãos do secretário de segurança pública do estado, José Mariano Beltrame, solicitada pelos praticantes do espiritismo ameaçados pela agressividade imposta pelos auto-denominados "Bandidos de Cristo", cujos fuzis são abençoados em cultos nessas igrejas.

Embora já tenha ido uma vez a um terreiro em dia de festa de Ogum (São Jorge, para quem não conhece), não faço parte do credo e tampouco defendo as práticas da umbanda e candomblé. Em determinadas situações elas conseguem prestar mais deserviço à ordem pública do que as igrejas, quando das vezes em que alguns de seus adeptos poluem as ruas com oferendas diversas a seus santos e entidades primitivas. Mesmo assim é reservado à eles, segundo a Lei VI do Artigo 5º. da Constituição, o direito de praticar seus rituais do mesmo modo que as igrejas cristãs-judaicas-islâmicas (só pra ficar nos exemplos maiores), afinal, apesar da bagunça, isso aqui ainda é uma democracia laica, não é?

A questão vai além de seus desdobramentos sociais. Ser religioso monoteísta em uma sociedade moderna imersa em um mundo globalizado é equilibrar-se em um delicado muro que separa crenças e dogmas em uma circense e hipócrita demonstração de tolerância. Pelo menos para ser politicamente correto, a maioria tenta ver condescentemente o outro como uma espécie de ignorante que não conhece a verdade e está involuntariamente do lado errado da cerca. Quando não há vontade de respeitar a diferença, enxerga-se um adversário de fé, um inimigo que acredita e cultua aquilo que os respectivos dogmas chamam de diabo, espíritos malignos, encostos, "coisa do mundo" etc.

Já seria um problema bastante complicado se apenas fossem palavras soltas em livros de fés primitivas e sem importância. Mas suas lideranças reforçam o sentimento de diferenciação de seu rebanho, como é o caso do atual pontífice da ICAR, Joseph Ratzinger, que insiste em deixar bastante claro seu narcisismo dogmático ao recentemente publicar bulas que afirmas a ICAR como sendo "verdadeira e única depositária da fé cristã".

No fundo, no fundo, nem é tão novidade assim. Quantas matanças, desterros e injustiças contra praticantes de outros credos que não a da religião dominante já não foram levadas à cabo em nome de deus ao longo da história? A história apenas se retepete, agora bem mais perto de nós.

15.3.08

Malleus Maleficarum

Em virtude de estar nos preparativos para iniciar meu projeto de mestrado, cujo assunto se dá em torno do filme Clube da Luta (David Fincher - 1999) e sua relação com as mulheres, tenho entrado em contato com alguns materiais que falam da opressão feminina ao longo da história. Embora não pretenda incluir a religião no escopo da minha futura tese, o tema é bastante comum dentro de praticamente todas as crenças e talvez valha citação à respeito, pelo menos aqui.

Trata-se de um dos textos anti-femininos que mais me repulsa, o Malleus Maleficarum (do latim Martelo das Feiticeiras). A obra foi baseada em uma bula emitida pelo então papa Inocêncio VIII e escrita por dois inquisidores ultra-radicais alemães (que certamente não gostavam de mulher) e publicada em 1486 (algumas fontes falam em 1487) e usado durante 250 anos, inclusive pelos protestantes. Os autores desse manual de caça Às bruxas, Heinrich Kramer e Jakob Sprenger, além de repetir e ampliar preconceitos e falácias sexistas de Santo [sic] Agostinho com pérolas do tipo

"Mulheres não deveriam ser educadas ou ensinadas de nenhum modo. Deveriam, na verdade, ser segregadas já que são causa de horrendas e involuntárias ereções em santos homens" (!)

Escoltando essas tragicômicas teorias, o livro trazia intruções detalhadas sobre métodos de tortura para se obterem confissões, tão desumanas, tão cruéis, tão sádicas que nem vale menção ou referência aqui. Procurem por si mesmos se interessar. Minha intenção aqui é de relatar coisas do calibre de

"Quando uma mulher pensa sozinha, ela pensa maldades"

"Se uma mulher se atreve a curar sem ter estudado, ela é uma bruxa e deve morrer"

"A mulher é uma mentirosa por natureza (...) ela é uma inimiga insidiosa e secreta"

"Elas são mais fracas de espírito e corpo (...) as mulheres são, intelectualmente, como crianças (...) as mulheres têm memória mais fraca e é um vício natural nelas não serem disciplinadas mas obedecerem a seus próprios impulsos sem noção do que é apropriado"

"E convém observar que houve uma falha na formação da primeira mulher, por ter sido ela criada a partir de uma costela recurva, ou seja, uma costela do peito, cuja curvatura é, por assim dizer, contrária à retidão do homem. E como, em virtude dessa falha, a mulher é animal imperfeito, sempre decepciona e mente"

"Ninguém causa maior dano à fé católica do que as parteiras"

Aqui cabe um comentário. As parteiras, seja por erudição ou empiricismo, conheciam métodos de parto que minimizavam as dores das futuras mães, comum entre celtas e outros povos considerados pagãos. Esse procedimento contrariava o que está escrito em Gênesis 3:16, quando supostamente o bondoso deus amaldiçoa o gênero condenando-o a dar à luz com dores típicas do parto (Certamente achavam que se não doesse, o diabo estaria agindo...).

Será que a ICAR vai acrescentar um décimo quarto mandamento contra a anestesia perineal?

11.3.08

George Carlin

Tenho estado um pouco travado para postar alguma coisa mais recente aqui no blog. Revirando meus vídeos favoritos do YouTube lembrei dessa pérola do humor ácido que é a esquete sobre religião do comediente americano George Carlin. Não é material novo mas, além de engraçadíssimo e espirituoso, certas verdades valem a pena serem revistas!


"Bullshit!"

21.2.08

Um golpe contra a liberdade de imprensa

O editorial abaixo foi retirado do site do Estadão e reflete o profundo amálgama de desgosto, revolta e nojo que acomete todos que lutam por um estado laico e livre da influência perniciosa da religião dentro do mecanismo do país. A IURD, que já vinha usando os poderes da própria comunicação para atingir seus objetivos puramente financeiros, agora pretende parasitar o judiciário e reinstaurar a censura no país, e o pior: dentro dos tramites legais. Como se já não bastassem as pressões que a própria profissão já impõe (já trabalhei em jornal e sei como é o corre-corre), para o nosso próprio bem espero que profissionais como a jornalista Elvira Lobato não se deixem oprimir por tais armadilhas obscenas que vão de encontro com a própria democracia.

O presidente Lula pode ser perdoado por não saber, talvez, o que são liberdades negativas. Cunhada por um dos mais notáveis filósofos políticos do século 20, Isaiah Berlin (1909-1997), a expressão designa, entre outras, a liberdade de não sofrer abusos ou de não ser intimidado. Nas sociedades abertas, elas fazem par com as liberdades positivas, a começar daquela da qual dependem todas as demais - a liberdade de expressão. Já o que não se pode perdoar a Lula é a sua solidariedade, acondicionada em transparente hipocrisia, aos atos intimidatórios desencadeados contra a Folha de S.Paulo e outros jornais pela Igreja Universal do Reino de Deus, ou, nominalmente, pelos seguidores do notório fundador da seita, o autoconsagrado bispo Edir Macedo. Para a Associação Brasileira de Imprensa (ABI), trata-se de uma campanha coercitiva sem precedentes no País.

A pretexto de serem ressarcidos por alegados prejuízos morais - demandando valores suspeitamente modestos, não superiores a R$ 10 mil -, "pastores e fiéis", como que em iniciativas distintas, mas com textos praticamente idênticos, pediram a abertura de 56 ações em 56 municípios espalhados pelo País. A orquestração foi caracterizada pela Associação Nacional de Jornais (ANJ) como "uma iniciativa capciosamente grosseira e que afronta o Poder Judiciário, já que pretende usá-lo com interesses não declarados". Não por outro motivo, dois dos cinco juízes que até agora se manifestaram sobre as petições, todos se recusando a acolhê-las, condenaram os seus autores por litigância de má-fé. Foi essa a "estréia" da represália do "bispo" Macedo, por interpostas pessoas, a uma reportagem da jornalista Elvira Lobato, publicada em 15 de dezembro na Folha, sobre o seu "império empresarial".

Direta ou indiretamente, apontava a reportagem, ele é o maior detentor de concessões na mídia eletrônica brasileira - são 23 emissoras de TV, entre elas a geradora da Rede Record, e 40 de rádio. A elas se somam 19 outras empresas diversas. A extensão financeira do conglomerado, registrada no paraíso fiscal de Jersey, no Canal da Mancha, serviria para esquentar os dízimos recebidos pela Universal. Se a igreja e o seu fantasticamente bem-sucedido CEO pedissem a abertura de processo contra o jornal e a jornalista, no foro apropriado, seria um caso legítimo de quid pro quo. Nessa hipótese, o presidente Lula estaria certo ao dizer que "a liberdade de imprensa pressupõe isso". Mas ele sabe que a liberdade de imprensa não pressupõe que a parte atingida responda com ações simultâneas em 20 Estados. "Isso" é uma tentativa torpe de amordaçar os meios de comunicação sob a capa de uma busca legítima de reparação pela via judicial.

Ora - mais uma vez a pergunta se impõe -, a quem o presidente pensa que engana? Ele e Edir Macedo são aliados que confraternizam ostensivamente. O braço político da Universal, o PRB, faz parte da coalizão lulista. A ele é filiado o vice José Alencar. E por aí se chega à essência da questão. A ameaça de fundo à liberdade de imprensa - e à democracia que, segundo Lula, a avalanche de ações retaliatórias "vai consolidando no Brasil" - reside na apropriação de um bem público, o espaço por onde trafegam os sinais de rádio e TV, por emissoras confessionais a serviço do interesse político de seus controladores. A concentração de poderes midiáticos em mãos de supostos salvadores de almas - que, de resto, se comportam como adeptos de Mammon, o deus pagão do dinheiro - não é menos nociva do que o chamado coronelismo eletrônico das oligarquias políticas regionais.

Onde a separação entre Estado e Igreja é um princípio inerente à ordem constitucional, como é o caso do Brasil, governo algum tem o direito de prestigiar um grupo político indissociável de uma entidade religiosa. Mas é o que faz, sem tirar nem pôr, o governo atual. É de pasmar a indiferença, ou a cumplicidade, do presidente da República com os golpes desferidos contra órgãos de mídia para lhes causar transtornos tais que possam induzi-los no futuro a hesitar a expor, a bem do interesse da sociedade, a face oculta de figuras e organizações que se nutrem da (ingênua) confiança popular. O lulismo já demonstrou antes que não é bem um baluarte da liberdade de imprensa. Agora, Lula foi além das tamancas.

Fazendo coro junto ao blog Ceticismo.

20.2.08

Sobre divindades em cenários de RPG

Todo mundo que me conhece pessoalmente sabe que jogo RPG, meu hobby desde os 11 anos. Mas como a gente cresce e amadurece, evoluem também as formas críticas de enxergar as coisas. Dia desses estava pensando na possibilidade de se criar um personagem genuinamente ateu/agnóstico dentro de um mundo de fantasia, onde a magia e a divindade sejam fatores reais. Como não acreditar no que é óbvio, no que é rico em provas que o corroborem in loco? Insanidade, talvez! hehe

Hmmm... Isso me deu uma idéia pra um personagem...

Atualmente tenho jogado apenas D&D, pois meu grupo original de GURPS está com problemas para sincronizar os horários livres (todos vocês devem ter passado por isso, principalmente os veteranos). Isso me levou a conhecer um pouco mais o sistema de ano e meio pra cá e tenho observado algumas coisas curiosas.

Quanto ao teísmo o D&D é muito mais hermético no tocante à liberdade de um personagem ser ateu, já que a classe dos Clérigos e Paladinos é uma prova da existência de seres onipotentes (ou quase) dentro do cenário, já que são operadores de magia divina. Fora as aparições reais de avatares, milagres, intervenção real no mundo através de seus poderes etc.

Mesmo o GURPS, quando o cenário permite isso, o fato de ser um sistema genérico permite uma maior flexibilidade enquanto que para isso o D&D exige um uso mais abrangente e mais grave da Regra de Ouro. Ou seja, você pode abdicar da presença divina e seu personagem pode não acreditar, se assim desejar. Ainda assim, dada a característica de onipotência do próprio Mestre, muitas coisas podem acontecer que certamente colocariam um personagem em dúvida, já que o divino apenas se esconde atrás de um escudo de papelão e rola dados em segredo...

30.1.08

Meu Nome não é Johnny

Assisti semana passada o filme Meu Nome não é Johnny, do diretor Mauro Lima (Brasil, 2007), e dentre os vários atributos da história, uma citação me chamou atenção logo em uma das tomadas iniciais do filme, a que mostra o cartão de natal que João Estrella, protagonista do longa interpretado por Selton Mello, recebe da juíza que julgou seu caso. A frase da escritora belga Marguerite Yourcenar

"O verdadeiro lugar de nascimento é aquele em que lançamos pela primeira vez um olhar inteligente sobre nós mesmos"

me fez pensar sobre as várias vezes que lancei olhadelas fortuitas sobre minha condição não-religiosa. Aliás, como é recorrente entre os críticos do ateísmo, que parecem enxergar na maioria de nós uma soberba e uma indisfarçável sensação de superioridade e inteligência, achei melhor abrir essa ressalva aqui antes de prosseguir. Quando me refiro a um olhar inteligente, refiro-me principalmente a um olhar crítico e lúcido, com discernimento, nesse caso, sobre a real natureza da religião sobre a vida, desprovido de explicações metafísicas para nossa origem ou propósito no mundo.

Meu verdadeiro lugar de nascimento, segundo o pensamento de mademoiselle Yourcenar, foi a varanda da minha casa, quando tinha 15 anos. Lembro-me de quando comecei a estranhar as coisas que me eram ensinadas, especificamente quando minha mãe me proibia de jogar RPG por ser "jogo do demônio" ou algo assim, pelo simples fato de que é assunto recorrente em aventuras de fantasia a menção a demônios, dragões, elfos, vampiros, feiticeiros e demais seres do imaginário rpgístico. Um dia sugeri fazer um RPG com temática bíblica, já que parecia que o que era "demoníaco" para os cristãos era o tema, e não o jogo. Cheguei a esboçar regras para ser um hebreu do velho testamento ou mesmo um soldado romano nas histórias contemporâneas à lenda de Jesus. Qual não foi minha surpresa quando ela proibiu de ligar assuntos da bíblia ao RPG! Não havia motivo, já que o assunto proibido havia sido extirpado, não é? Foi quando comecei a questionar o porque de tais arbitrariedades, quando pela primeira vez lancei um olhar inteligente sobre minha vida.

Do rarefeito universo de meus leitores, imagino que poucos sabem que já fui evangélico, criado desde o nascimento na Igreja Congregacional Campograndense, uma denominação cristã que guarda várias semelhanças dogmáticas com os batistas. Minha bíblia que uso para consultas esporádicas ainda é a mesma que ganhei quando recém-nascido (antes que vejam nisso um apego sentimentalóide sobre o livro, apresso-me a dizer que apenas não gosto de jogá-los fora). A frase de Marguerite, embora inspiradora, não é de todo verdade, não para aqueles que levam o ceticismo a um patamar mais íntimo do que simplesmente ausência de credulidade passiva.

Na verdade nós nascemos e várias vezes durante a vida, pois aqueles comprometidos com a verdade sabem que no fundo ela varia conforme as provas e evidências são descobertas. Nasci de novo quando percebi que a religião não é responsável pela manutenção da moral do mundo. Nasci de novo quando vi que a religião não passa de uma muleta que vicia o caminhar ao invés de ajudar a curar um aleijão. Nasci de novo quando constatei que a hipocrisia do pensamento cristão é plenamente nociva para a sociedade, doutrinando crianças em tenra idade, incapazes de se defender ou esboçar criticidade. Esses pequenos e propensos natimortos intelectuais, acatam como verdades imutáveis toneladas de lorotas de uma crença rudimentar e tosca, escritas em um livro cujos alicerces são a xenofobia, a subvalorização da mulher, a escravidão e o derramamento de sangue inocente pela espada daqueles que hoje se dizem seguidores de um deus de amor.